...pela desobediência de um só homem, muitos se tornaram pecadores...
Romanos 5:12a
A questão do "Pecado Original" gerou discussões teológicas por séculos na história da interpretação bíblica, e basta pensar um pouco sobre esse tema para saber por que! Como pode ser justo que todos nós sejamos pecadores não por culpa nossa? mas por culpa de Adão e Eva? Como entender isso e quais as implicações dessa compreensão para entender a humanidade dos pecadores, e a humanidade de Cristo sem pecado?
Nesse Post traga a tradução de um texto magistral de Gerhard Pfandl publicado originalmente no site do Instituto de Pesquisas Bíblicas da Conferência geral! (Acesse o artigo original em inglês aqui!!!) na esperança de que ele ofereça luz aos estudantes desse tema!!!
Para ler o artigo clique no link "Mais informações" logo abaixo!!!
Graça e Paz!!!
Alguns pensamentos sobre Pecado
Original
Por: Gerhard Pfandl, Ph.D.
Introdução
Pecado
não é meu assunto favorito. Eu preferiria escrever sobre o amor de Deus, sobre
Cristo, ou sobre profecias. Contudo o pecado desempenha uma parte importante no
grande conflito, e a Bíblia fala muita coisa a respeito do pecado, assim como
fazem os teólogos. Dentre os 19 volumes de G. C. Berkouwer sobre dogmática, o maior volume é sem
dúvida o que trata do pecado com 590 páginas. Seus dois volumes sobre
justificação e santificação têm menos de 400 páginas.
Por
que esse assunto é ao importante? Por que sem o pecado nós ainda estaríamos no
jardim do Éden. Sem um correto entendimento sobre a origem e sobre a natureza
do pecado nós teremos uma visão distorcida de Cristo e da salvação. De fato,
muito de nossa discussão sobre a natureza de Cristo e sobre o perfeccionismo é
fútil, a menos que primeiramente nós cheguemos a um entendimento apropriado
sobre o que é o pecado realmente.
Por
que esse assunto é tão vasto, nesse documento eu me concentrei no conceito do
pecado original. Outros aspectos do pecado serão tratados enquanto eles
contribuírem para um entendimento do pecado original.
- Definição
“Pecado
original” como “trindade” não é uma expressão bíblica, mas uma expressão
teológica. Ainda assim, o termo expressa o que a maioria dos teólogos cristãos
acredita ser um conceito bíblico. Um catecismo católico faz a pergunta: “o que
é o pecado original?” a resposta é dada: “Pecado original é a culpa e mancha que
herdamos de Adão que foi o originador e cabeça da humanidade.”[1]
Notamos que a resposta claramente identifica dois aspectos do pecado original:
(a) culpa herdada; e (b) mancha herdada. A mancha herdada se refere a nossas
paixões pecaminosas, nossas tendências e propensões para o pecado.
- O assunto e
perguntas a respeito dele[2]
Uma
grande porção das escrituras é devotada à questão do pecado. “depois da palavra
“Deus,” a palavra pecado é a palavra mais fortemente carregada de significado
para a raça humana e para todo o universo.[3]
Mas como o pecado deveria ser definido? É o pecado um ato, simplesmente a
transgressão da lei (1 Jo 3:4), ou se refere a um estado de existência? É a
natureza corrupta em si mesma pecaminosa ou não? Deveria o pecado como um
estado de existência ser considerado a causa dos atos pecaminosos? E quanto às
crianças? Elas nascem já pecadoras, ou se tornam pecadoras na primeira vez que
transgridem a lei? O homem é um pecador por que peca, ou peca por que é um
pecador? O que nós herdamos de Adão? Essas são as questões e temas que vamos
analisar.
Os
adventistas estão divididos a respeito da maneira como o pecado deve ser
definido. Heppenstall, por exemplo, escreveu: “esse estado de pecado no qual os
homens nascem é chamado de pecado original- não no sentido de culpa herdada,
mas de uma herdada disposição para o pecado. Ela volta até uma fonte original,
o pecado de Adão e Eva, os primeiros pais da raça humana. Envolvida nessa
condição pecaminosa de todos os membros da raça humana antes que eles mesmos
fossem realmente culpados de cometer pecado.”[4]
Em
contraste com essa posição, D. E. Priebe disse: “Pecado não é basicamente o que
um homem é, mas o caminho que o homem escolhe... o pecado se relaciona mais com
a vontade do homem do que com sua natureza.”[5]
Desde
que essas questões tratam de assuntos importantes, nós primeiramente olharemos
nas evidências bíblicas, então vamos explorar a história da doutrina do pecado
original, e por último vamos investigar o entendimento dessa doutrina ente os
adventistas do sétimo dia.
- A evidência
Bíblica
A
Bíblia é muito explícita relativamente à extensão (universalidade) do pecado
assim como em relação a sua intensidade.
A extensão do pecado: A
universalidade do pecado é estabelecida a partir de declarações diretas das
Escrituras.
(1
Reis 8:46) Quando pecarem contra ti (pois não há homem
que não peque)
(Salmo
14:3) Todos se extraviaram e
juntamente se corromperam; não há quem faça o bem, não há nem um sequer.
(Eclesiastes
7:20) Não há homem justo sobre a terra que faça o
bem e que não peque.
(Romanos
3:10) como está escrito: Não há justo, nem um
sequer,
(Romanos
3:23) pois todos pecaram e carecem da glória de
Deus,
Mesmo
os heróis da fé de Hebreus 11 que são descritos como perfeitos (Gen 6:9), como
amigos de Deus (Tiago 2:23), ou de homem segundo o coração de Deus (Atos
13:22), eram pecadores. Noé ficou bêbado (Gen. 9:21), Abraão (Gen. 12:13), Davi
foi um adúltero e assassino (2 Sam 1). Dessa
forma eles poderiam se juntar a todos nós seres humanos ao repetirmos as
palavras de Isaías (53:6) “todos nós nos desviamos como ovelhas, cada um para o
seu caminho.” A exceção é uma só, Jesus Cristo, é mencionado no texto de Isaías
“e o Senhor fez cair sobre Ele a iniqüidade de nós todos.”
O
fato de que as Escrituras relatam a necessidade universal de expiação (João
3:16; Atos 4:12), de regeneração (João 3:3,5), e de arrependimento (Atos 17:30)
também indicam que o pecado é universal. Uma prova adicional é o fato de que
todas as pessoas são sujeitas a morte, a penalidade do pecado (Rom. 6:23).
A intensidade do pecado
Como
o pecaminoso é pecador? Quão profundo é o nosso pecado? Somos basicamente bons,
criados a imagem de Deus, mas por causa da tentação nós transgredimos a Lei de
Deus; ou nós somos basicamente maus, com a imagem de Deus quase totalmente destruída,
e por causa da nossa natureza má é que cometemos pecado?
A
Bíblia geralmente define o pecado como um ato, 1 joão 3;4 dia que a
“transgressão da lei é o pecado,” ou o “pecado é iniqüidade.” No velho
Testamento a palavra mais comum usada para pecado é (chata’) que em seu senso
mais literal significa: “errar o alvo” como em Juízes 20:16 “Entre todo este povo havia
setecentos homens escolhidos, canhotos, os quais atiravam com a funda uma pedra
num cabelo e não erravam (Chata’).” Em termos morais, “errar o alvo” se refere ao fato de que a Lei de Deus é o
padrão do comportamento ético ao qual devemos objetivar. Assim, quando José
diz: “como, pois, cometeria eu tamanha maldade e pecaria contra Deus?” (Gen.
39:9), ele está dizendo com efeito: “Como eu posso cometer tamanha maldade e
ficar aquém do padrão revelado na lei de Deus?” Errar o alvo não é meramente um
erro acidental, mas um voluntário e culposo ato errado. C.R. Smith disse:
As centenas de exemplos do uso moral da palavra pressupõem que o ímpio “erra
o alvo correto” e “erra o caminho certo por que deliberadamente segue um
caminho errado” (ou tem um alvo errado). Ou seja, não há a possibilidade de ser
um erro inocente ou meramente a ideia de fracasso.[6]
Há
várias outras palavras hebraicas que expressam a idéia de pecado como um ato.
Por exemplo: Shaga (falha intensa em 1 Sam 26:21); chet (errar em Isa 1:18);
ou pesha (rebelião em 1 Rs 12:19). No Novo Testamento
as palavras mais freqüentemente usadas para pecado
são: Hamartano (43 vezes)[7],
Hamartia (173 vezes)[8],
também enfatizando o pensamento de se errar um ponto ou alvo.[9]
Entretanto,
um grande número de textos no Velho e no Novo testamento se referem ao pecado
como um estado, ou tendência do coração. Jeremias representa o pecado como uma
doença espiritual que aflige o coração. Ele diz que o coração é “enganoso e
desesperadamente corrupto: quem o conhecerá?” (jer. 17:9). Davi no salmo 51
expressa o pensamento de que ele já nasceu pecador, “Eu nasci na iniqüidade, e em
pecado me concebeu minha mãe.” Note que a mãe dele não fez nada
errado m conexão com sua concepção ou nascimento, ela era uma mulher honrada,
mas ele reconhece que ele nasceu com uma natureza pecadora. Ele deseja ser
lavado e limpo do pecado (51:2, 7) e pede a Deus que crie nele um coração puro
(verso 10). O mesmo pensamento é expresso em salmo 58:3: “Desviam-se os ímpios desde a
sua concepção; nascem e já se desencaminham, proferindo mentiras.” Israel é
chamado de “transgressor desde o ventre” (Isaías 48:8). E “Desde a planta do pé
até à cabeça não há nele coisa sã, senão feridas, contusões e chagas
inflamadas, umas e outras não espremidas, nem atadas, nem amolecidas com óleo.”
(Isaías 1:6).
O
verbo hebraico chashab (pensar) e suas
derivações aparecem cerca de 180 vezes no Velho Testamento. Ele é usado em
conexão em conexão com os pensamentos e propósitos de Deus, mas especialmente
em referência às enganosas e pecaminosas divisas do coração do homem. Em Genesis
6:5 Deus olha para baixo em direção à terra e vê que a maldade do homem é
grande, “toda imaginação dos pensamentos (chashab) de seu coração era somente má continuamente.” Os
pensamentos dos homens, diz Isaías, são pensamentos (chashab) de
iniqüidade. (59:7). Ele adiante chama os ímpios a “abandonarem seus caminhos, e
o ímpio os seus pensamentos (chashab)” (55:7).
O Novo testamento é ainda mais claro e mais
enfático nessa questão. No sermão da montanha Jesus fala da interna disposição
como pecado. Mateus 5:21-22, 27-28. Aos fariseus ele disse: “Raça de víboras, como podeis
falar coisas boas, sendo maus? Porque a boca fala do que está cheio o coração.”
(Mateus 12:34). Ações e palavras malignas se desenvolvem a partir dos
pensamentos do coração: “Porque do coração procedem maus desígnios, homicídios,
adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhos, blasfêmias.” (Mateus
15:19). Essa pecaminosidade do coração humano, a que chamaremos de PECADO,
produz atos individuais de transgressão que são pecados. Assim, por natureza
somos filhos da ira (efésios 2:3) que são incitados ao pecado por suas próprias
cobiças (Tiago 4:1).
O próprio testemunho de Paulo
também é um poderoso argumento que é a corrupção da natureza humana que produz
os pecados individuais. Ele recorda que “quando vivíamos segundo a carne, as
paixões pecaminosas postas em realce pela lei operavam em nossos membros, a fim
de frutificarem para a morte.” (Rom 7:5). Ele vê o pecado em seus membros: ”mas
vejo, nos meus membros, outra lei que, guerreando contra a lei da minha mente,
me faz prisioneiro da lei do pecado que está nos meus membros.” (verso 23). Em
gálatas 5:17 ele escreve que a carne milita contra o Espírito, e o Espírito,
contra a carne. A palavra aqui é epithumeo, que pode se referir tanto ao desejo neutro quanto a um desejo
impróprio. Há inúmeras “obras da carne: “prostituição, impureza, lascívia, idolatria,
feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções,
invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes” (19-21). Portanto no
pensamento de Paulo como no pensamento de Jesus, os pecados são resultados
(produtos) da natureza humana. Em todo ser humano há uma forte inclinação em
direção ao mal com efeitos definidos.[10]
O único ser humano sem pecado
nas Escrituras é Jesus. Somente dele nós lemos que: “ele não conheceu pecado”
(2 cor 5:21); que ele era “separado dos pecadores” (Heb 7;26); e que “nenhum
dolo foi achado em sua boca” (1 Pe 2:22). Assim se pode dizer que ele é “o
cordeiro sem culpa ou mancha” (1 Pe 1:19).
Total depravação
Total depravação é a expressão
usada para descrever o efeito compreensível (passível de ser comprovado [nota
do tradutor]) efeito do pecado. Isso não significa que os seres humanos todos
sejam tão maus quanto seriam capazes de ser, nem que haja nenhum traço de
bondade neles. A expressão total depravação simplesmente se refere ao fato de
que o homem como um todo foi infectado com o pecado (Rom. 6:6, 12; 7:24; 8:10).
Sua mente ou razão está envolvida (Rom. 1:28; 2 Cor 3:14-15; 4;14), e sua alma
ou suas emoções foram pervertidas (Rom. 1:24-27; 2 Tim. 3:2-4). Finalmente,
também sua vontade foi afetada pelo pecado. A pessoa não convertida não possui
verdadeiramente o livre arbítrio. Ela é uma escrava do pecado (Rom. 6:17). Ele,
adiante, é incapaz mesmo de entender e encontrar a verdade sobre si mesmo como
Deus o vê.
“O homem em sua pecaminosidade não pode apreender a verdade de Deus. Cada
geração sucessiva comete os mesmos erros trágicos. Parece que o homem nunca
aprende. As tendências malignas abundam. O pecado tem produzido uma radical
insanidade que se manifesta nas paixões malignas, ambições egoístas, desejos
selvagens, emoções irracionais que são maldições que acompanham todos os homens
sob a face da terra”[11]
Se essa natureza inata deve
ser entendida como um estado de pecaminosidade por causa do qual mereçamos
condenação, ou apenas algo como uma inerente propensão ao pecado, é algo que
será discutido mais tarde. Por agora devemos voltar nossa atenção à questão da
origem.
A origem de nossa natureza pecaminosa
A doutrina da origem do pecado
não é em nenhum lugar das Escrituras desenvolvida de forma sistemática. Ela é
baseada em passagens isoladas e depois reunidas de todas as partes da
Escrituras. Teólogos por toda a história têm colocado esses textos juntos para
estabelecer essa doutrina. Um dos textos-chave usados para sustentar essa
doutrina é Genesis 3, a história da queda. Contudo, encontramos em uma análise
mais de perto, vários resultados do pecado de Adão: culpa (3:8); inimizade
(3:15); sofrimento ao nascer (3:16); trabalho duro (penoso) (3:19); morte
(3:19); etc. Mas a depravação da humanidade não é especificamente citada. Isso
pode explicar por que, tirando possíveis referências a Genesis 3 em Isaías
43:27 e em Oséias 6:7, o Antigo Testamento em nenhum lugar explicitamente
conecta a queda com a universal pecaminosidade do ser humano. Ele descreve a
realidade do pecado e afirma que o homem é pecador desde o nascimento, mas não
explica como o pecado é passado adiante de geração a geração.
Paulo é o único escritor
bíblico que claramente conecta a queda do homem com nossa morte e com nossa
natureza pecaminosa. Em 1 Cor 15:21-22 ele ensina que a morte teve sua origem
em Adão: “Visto que a
morte veio por um homem, também por um homem veio a ressurreição dos mortos. Porque,
assim como, em Adão, todos morrem, assim também todos serão vivificados em
Cristo.” Em Romanos 5:12 ele disse que o pecado igualmente veio através de
Adão. “Portanto, assim como por
um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a
morte passou a todos os homens, porque todos pecaram.”
É particularmente a parte
final de Rom. 5:12 que tem causado considerável debate entre os intérpretes. A
expressão “todos pecaram” se refere aos pecados individuais de todos, ou ao
fato de que todos os homens de alguma forma “pecaram” em Adão? Tanto quanto a
gramática do grego possa nos auxiliar as duas coisas são possíveis. Se
escolhermos a primeira interpretação, o significado é que o resultado do pecado
de Adão é meramente que ele próprio se tornou sujeito à morte, e adiante, por
que todos os homens pecaram todos se tornaram sujeitos ao mesmo destino. Esse
parece ser o sentido pleno do texto. O aoristo “hemarton” “pecaram” é entendido da mesma forma como em 3:23 “todos
pecaram e carecem da glória de Deus.”
Contudo se Paulo pretendia que
todos se tornaram sujeitos à morte, por causa dos próprios pecados, a conclusão
logicamente serial que todos recebem vida eterna na base da justiça que eles
mesmos alcançassem. Mas isso é rejeitado pelas afirmações de Paulo em 5:17-19.
A morte passou a todos através da queda de um só homem (Adão), assim da mesma
forma a vida é concedida a todos por causa da justiça de um só homem (Jesus
Cristo).
A segunda interpretação,
entretanto, entende “todos pecaram” como sendo: “todos os homens pecaram em Adão.[12]
Isso é sustentado por um apelo à 2 Cor 5:14, a morte de um foi a morte de
todos. Assim em Romanos 5:12 o pecado de um seria o pecado de todos. Além
disso, essa interpretação é fortalecida pelo contexto imediato de Romanos 5; “pela ofensa de um só, morreram
muitos” (5:15), “pela ofensa de um e por meio de um só, reinou a morte” (5:17).
“Pela desobediência de um só muitos foram feitos pecadores” (5:19). Dessa forma
parece que “Paulo ensina que o pecado de Adão produziu não apenas a penalidade
da morte, mas também um real estado de pecado”[13].
“Finalmente, o aoristo hemarton “pecaram” é
relacionado com os dois outros aoristos no verso 12; “o pecado entrou
(eiselthen) no mundo” e “a morte passou (dielthen) a todos os homens” Todos os
três aparecem como aoristos históricos indicando o que aconteceu no Éden.”[14]
Como o pecado de Adão resultou
no pecado e na morte da humanidade, e como Romanos 5:12 deve ser entendido
corretamente, tem sido objeto de discussão por mais de dois mil anos.
- A história da doutrina do pecado original
A apócrifa
Durante o período
inter-testamental Ben Sira (ca. 180 B.C.) o autor de sabedoria de Jesus filho de Sirac (também conhecido como Eclesiástico)
escreveu, “A partir de uma mulher começou a pecado; a por causa dela todos nós morremos” (Sir. 25:24). E o
desconhecido autor de Sabedoria de
Salomão (ca. 150-50 B.C.) afirmou que, “Deu criou o homem incorruptível, e
à sua imagem e semelhança o criou. Mas
pela inveja do Diabo a morte veio ao mundo, e eles que pertencem a ele a
experimentarão” (Sabedoria de Salomão 2:23-25).
Esses são as mais antigas
fontes extra-bíblicas ensinando que a morte é o resultado do pecado de Adão e
Eva. Contudo, uma afirmação específica de que o pecado de nossos primeiros pais
é transmitido para cada um de seus descendentes – ideia do que seja o peado
original – não é encontrado em nenhum lugar.[15]
A literatura apocalíptica judaica
A literatura apocalíptica judaica floresceu entre 200 a.C. e 150 d. C.
Esses escritos lidam primariamente com o futuro, o fim deste mundo, ao invés de
com o presente. Frequentemente na forma de experiências visionárias eles
descrevem o mundo espiritual dos anjos e dos poderes cósmicos; e eles se ocupam
mais com os propósitos de Deus do que com as ações de homens. Entre os exemplos
mais bem conhecidos estão: O livro de
Enoque; O quarto livro de Esdras;
O apocalipse de Baruque; O livro dos
Jubileus; e A assunção de Moisés.
De Qumran vem A guerra dos filhos da luz
contra os filhos das trevas.[16]
A ideia da morte como uma pena herdada é mencionada um número de vezes
nesses escritos. Alguns autores colocam a culpa da morte em Eva, outros a Adão.
Apocalipse de Moisés (1º século d. C.)[17]
14:2
Adão disse a Eva: “por que
você trouxe destruição entre nós e trouxe sobre nós grande ira, pela qual a
morte está ganhando acesso sobre toda a nossa raça?”
4 Esdras
(100 d. C.)
3:7
Falando a Deus Esdras diz: “e Tu colocaste sobre
ele um mandamento teu; mas ele o transgrediu, e imediatamente tu designaste a
morte a ele e seus descendentes.”
2
Baruque (2º século d. C.)
23:4
“Quando Adão pecou e a morte foi decretada contra
aqueles que haveriam de nascer, a multidão dos que haveriam de nascer foi
numerada”
54:15
“Adão pecou primeiro e trouxe morte sobre todos que
não estavam em seu próprio tempo.”
56:6
“Pois quando ele transgrediu, atemporalmente a
morte veio à existência...”
Aparte da morte como
consequência da queda de Adão, 4 Esdras 7:118 parece indicar que em Adão todos
os seus descendentes caíram “Óh Adão, o que fizeste? Pois foste tu que pecaste,
(mas) a queda não foi só sua, mas nossa que somos teus descendentes.” E na obra
A vida de Adão e Eva (1º século d.
C.) o pecado de todas as gerações é traçado até Eva, “e Adão disse para Eva, o
que você fez? Você trouxe sobre nós grande ferida, transgressão e pecado em todas
as nossas gerações” (44:2).
No pensamento rabínico o
homem foi criado com um impulso bom (yetzer
ha-tob) e um impulso mal (yetzer
ha-ra) que lutam pelo predomínio no coração. Dessa forma lemos em 4 Esdras:
“Pois o primeiro Adão queimou com um coração mal,
transgrediu e foi vencido, como foi com todos que descenderam dele. Dessa forma
a doença se tornou permanente; a lei estava no coração do povo bem como a raiz
maligna, mas o que era bem partiu e o mal permaneceu.”
Através do estudo da Torá
o homem poderia proteger a si mesmo contra esses maus impulsos malignos do
coração.[18]
Dessa forma os “tannaim,” os pensadores religiosos citados na Mishná, diziam
que Deus disse o seguinte aos homens: “Se eu criei a má inclinação para vos
tentar ao erro, também criei a Torá para te manter afastado do erro.”[19]
Vemos então na literatura judaica uma tentativa de lutar com a questão do pecado
e de sua hereditariedade, mas uma afirmação não ambígua a respeito do pecado
original e de sua propagação está ausente.
Os escritos dos pais da igreja
A
controvérsia gnóstica, na qual o problema do mal teve um papel importante,
forçou a igreja primitiva a definir as doutrinas do estado original e da queda.
Os pais gregos
Os
pais gregos viam o homem como tendo sido criados “nem mortal, nem imortal, mas
capaz de ser ambas as coisas; seu destino dependia de como ele exercitasse seu
livre arbítrio.”[20]
Quando o ser humano caiu ele se tornou mortal e corrupto. Essa corrupção física
era vista como sendo propagada na raça humana, mas não era considerado pecado
em si. Nem envolvia a humanidade em culpa.[21]
Romanos 5:12-21 era geralmente interpretado em termos da morte à qual o ser
humano se torou sujeito. O pecado em Romanos 5:12b “pois todos pecaram” era
entendido como se referindo ao pecado pessoal do homem.
Irineu (morreu em 195 d.C.), bispo de
Lion, via todos os homens como estando seminalmente presentes em Adão, o cabeça
da humanidade. Por virtude dessa união todos os homens eram concebidos como
existindo em Adão e dessa forma como estando pessoalmente envolvidos no pecado
de Adão. “No primeiro Adão”, ele escreveu “nós ofendemos a Deus, não
cumprimento seus mandamentos... a Ele somente nós nos tornamos devedores, cuja
ordenança nós transgredimos no princípio.”[22]
Contudo, ele negou que as crianças compartilhavam da culpa de Adão pois o
pecado sempre se iniciava com a escolha livre do homem.[23]
Orígenes (185-254 d.C.), um teólogo de
Alexandria, primeiramente ensinou a teoria da pecaminosidade do feto como
resultado da queda de todas as almas individuais em uma existência prévia e
celestial. Mais tarde, contudo, ele aceitou a doutrina da corrupção herdada,
introduzida pela queda de Adão.[24]
Para resumir: Os pais gregos
entenderam a morte como a penalidade pelo pecado de Adão. Eles acreditavam que
todos os homens estavam envolvidos no pecado de Adão e que esse pecado afetou a
nossa natureza moral. Eles ensinavam que nós herdados uma natureza corrupta,
mas que nenhuma culpa está ligada a ela.
Os pais latinos
Similar
aos pais gregos, os pais latinos viam o estado original do homem como um estado
de bem aventurança sobrenatural. Adão e Eva, criados imortais,[25]
radiavam perfeita inocência e virtude, eles estavam isentos da necessidade de
comida.[26]
Por causa do orgulho Adão caiu e se tornou imortal.
Tertuliano (160-251 d.C.), o fundador
da teologia latina, igualou o pecado original com a concupiscência (libido
sexual) que, por herança, Adão transmitiu a seus descendentes.[27]
Ele entendia isso em termos da doutrina traducionista da origem da alma, que
diz que todas as almas individuais estavam de alguma forma contidas em Adão de
quem eles derivam em última instância. Por seu pecado é dito que Adão infectou
a raça humana inteira com sua semente, fazendo dela o canal (traducem) da danação.[28]
Ele disse:
Cada alma, então, por razão de seu nascimento, tem
sua natureza em Adão até nascer de novo em Cristo; Mais ainda, é impura todo o
tempo em que ela continua sem essa regeneração; e por ser impura, é ativamente
pecaminosa, e cobre mesmo a carne com sua própria vergonha.[29]
Ambrósio (339-397 d.C.) e Ambrosiaster (4º século), dois outros
pais latinos, enfatizaram fortemente a ideia da solidariedade do homem no
pecado (original) por virtude da participação de todos no pecado de Adão.
Ambrósio:
“Em Adão eu cai, em Adão eu fui expulso do paraíso,
em Adão eu morri. Como Deus deveria me restaurar, a menos que ele me encontre
em Adão, justificado em Cristo, exatamente como no primeiro Adão eu estava
sujeito à culpa e destinado à morte.[30]
Ambrosiaster:
“É, portanto, claro que todos os homens pecaram em
Adão como em uma massa informe (quase in
massa). Pois Adão mesmo foi corrompido pelo pecado e todos que ele gerou
nasceram debaixo do pecado. Dessa forma nós somos todos pecadores a partir
dele, uma vez que todos nós derivamos dele.[31]
Não obstante, nenhum
desses escritores parece ter considerado esse pecado herdado como digno de
punição. Ambrósio explicitamente distingue nossa injustiça herdada pela qual
nós não devemos ser punidos de nossos pecados pessoais pelo quais devemos ser
punidos.[32]
E Ambrosiaster em sua interpretação de Romanos 5:12-21 atribui a morte de todos
os homens à imitação deles do pecado de Adão.[33]
Parece
haver certa quantidade de ambiguidade e incerteza nessas afirmações. Por um
lado Ambrósio fala do homem como sendo sujeito à culpa em Adão (ver acima), por
outro lado ele nega que a culpa de Adão é de alguma forma transferida para nós.
Possivelmente isso é uma indicação da tensão que esses escritores
experimentaram enquanto lutavam com o problema do pecado original.
Pelágio (5º século) era um britão bem
educado, treinado em advocacia, que apareceu em Roma por volta do ano 400
ensinando a perfeição cristã e chamando ao arrependimento e penitência.
De
acordo com Pelágio Adão foi criado com uma natureza média. i.e., nem santa nem
pecaminosa, mas com a capacidade do bem ou do mal. Ele foi criado mortal, mas
com inteira liberdade e com vontade indeterminada. Ele escolheu pecar ainda que
sua queda não machucou a ninguém além dele mesmo. Pelágio negava qualquer
transmissão hereditária de uma natureza pecaminosa, ou de culpa, dessa forma o
homem ainda nasce na mesma condição na qual Adão estava antes da queda. Não
existem más tendências ou desejos na natureza do homem. A única diference entre
Adão e o homem é que o último tem o exemplo do mal diante de si. O pecado não
consiste em afeições erradas ou desejos errados, mas somente em um separado ato
da vontade.[34] A
universalidade do pecado, disse Pelágio, é devida à má educação, ao mal
exemplo, a um hábito há muito tempo estabelecido de pecar. “por força do
hábito, o pecado atinge um poder semelhante ao poder da natureza – o pecado se
torna como se fosse ‘uma segundo natureza’.”[35]
A
graça de Deus para Pelágio é primariamente o presente de Deus em conceder uma
boa natureza ao homem com a capacidade de escolher livremente o bem e de fazer
o bem. Ele via a graça em termos de “dons externos e dotações naturais, tais
quais: a natureza racional humana, a revelação de Deus na Escritura, e o
exemplo de Cristo.”[36]
Jesus
Cristo, de acordo com Pelágio, é a plena concretização da graça original da
natureza. Como a direta imagem de Deus, Cristo é um espelho do que o homem é e
deveria ser. Por contemplar a Cristo o homem é transformado em sua imagem, pois
o exemplo de Cristo efetua uma resposta ressonante o mais profundo do ser
humano, i.e., em sua memória – a ligação noédica ontológica com sua natureza
original.[37]
O
pelagianismo com sua visão cor-de-rosa da natureza humana foi condenada em
vários concílios e foi finalmente anatematizado no concílio de Éfeso em 431.[38]
Agostinho (354-430),[39]
o maior dos pais latinos, foi bispo de Hipona no norte da África. Ele se tornou
o principal oponente de Pelágio.
Agostinho
concebeu quatro estágios na história do homem: Antes da queda, depois da queda,
depois da conversão, e na perfeição. No estado edênico o homem possuía uma
plena medida de liberdade. Ele podia escolher entre bom e mal e era dessa forma
capaz de se abster do pecado (posse non
peccare). Essa habilidade não era uma habilidade inata, não uma dotação natural,
mas um dom da Graça divina.
Uma
vez que o livre arbítrio contém a possibilidade de uma queda, o primeiro pecado
foi ocasionado pelo livre arbítrio. Através da queda o homem perdeu o dom da
graça e com ele a liberdade que constituía a habilidade de escolher o bem. Pois
quando a graça foi perdida, a natureza humana mudou. Sua atitude fundamental
mudou. Considerando que antes da queda a vida do homem era direcionada a Deus,
agora ela estaria direcionada em direção a si. O amor a si foi um substituto para
o amor a Deus. Os poder mais básico da natureza humana – a concupiscência –
assumiu uma posição de domínio. Em uma instância isolada a vontade pode vencer
a concupiscência, mas a direção da vontade, entretanto, não permanece a mesma.
O homem depois da queda
não mais tem poder de escolher o bem, ele agora tem uma compulsão pelo pecado.
Ele não é mais capaz de não pecar (non
posse non peccare). Isso não significa que ele não pode fazer boas obras
isoladas, mas a direção de sua vontade é em direção ao mal. Dentro dessa
atitude básica em direção ao mal o homem ainda tem uma livre vontade, mas o
homem só é livre para pecar.[40]
Agostinho cria que toda a
raça humana estava seminalmente presente em Adão, e portanto, também pecaram de
fato nele. Ele disse, “na escolha má direcionada daquele único homem todos
pecaram nele, uma vez que todos eram aquele único homem, de quem, por causa
disso, ele todos severamente originaram o pecado original”[41]
Através da procriação
sexual Adão transmitiu sua natureza caída (culpa e corrupção) à sua
posteridade. Dessa forma o homem, separado de Deus, queimou de culpa, e sob o
domínio do mal, não pode desejar aquilo que é bom à vista de Deus, i.e., aquilo
que flui do motivo do amor de Deus.
Aqui nós temos a primeira
clara definição de pecado original como ele veio a ser aceito pela maioria dos
cristãos daí em diante.
A salvação para Agostinho
e totalmente da graça de Deus, mas essa graça inclui a regeneração do homem. A
vontade do homem é alterada, e ele pode verdadeiramente fazer aquilo que é bom,
e dessa forma ele pode se tornar co-obreiro de Deus em fé. O homem é salvo pela
fé, mas essa fé também faz aquilo que é bom. As obras que se originam no amor
são vistas como sendo meritórias e elas serão eventualmente recompensadas. Mas
tal mérito só poder obtido pela graça.[42]
A base factual da salvação, para Agostinho, é a graça somente (não o livre
arbítrio humano), mas aquela que é a nota na obra da graça não é tanto a
justiça “estranha/exterior” de Cristo que é imputada a nós, mas antes, é a mudança
que se dá na vida do indivíduo nascido de novo.
Para resumir: Como os pais gregos, os pais latinos antes de
Agostinho ensinavam que a morte e a corrupção original são o resultado de sua
participação no pecado de Adão. A maioria deles, contudo, negou que a corrupção
do homem merecesse punição. Agostinho, na controvérsia com Pelágio, formulou a
clássica doutrina do pecado original que inclui a morte, a corrupção, e a
culpa.
De Tomás de Aquino até Armínio
Tomás de Aquino (1224-1274) foi o maior filósofo e teólogo da igreja medieval.
Construindo sobre os ensinamentos de Agostinho
e de Anselmo (1033-1109), Tomás de
Aquino definiu o pecado original como a privação da justiça original.[43]
Deus criou o homem e a mulher em um estado de justiça original que incluía
graça sobrenatural e a ausência da concupiscência e da morte. Além disso, nesse
estado original de inocência (justiça), a razão e a vontade do homem estavam em
submissão a Deus. Quando Adão se rebelou, o dom sobrenatural da graça lhe foi
retirado e a harmonia interior de sua natureza bem como sua submissão a Deus
foram perdidas.[44]
Essa é a condição do pecado original na qual todos os homens nascem. O pecado
original para Tomás de Aquino incluía a culpa uma vez que ele via a humanidade
como constituída de um só corpo no sentido de que uma comunidade cívica pode
ser descrita como sendo um só corpo.[45]
Em oposição a Tomás de
Aquino os reformadores mantiveram que o pecado original é mais do que uma mera
ausência de justiça original. Como Agostinho eles viam o pecado original como
uma corrupção total da natureza humana (depravação total). Eles consideravam
mesmo os primeiros movimentos de seus desejos, que tendem em direção ao pecado,
de serem pecados – pecados interiores que tornam os homens culpados e merecedores
de condenação.[46]
O concílio de Trento (1545-1563) foi um dos concílios mais importantes
na história da igreja católica romana. Ele foi reunido para deter o sucesso
contínuo do movimento da reforma protestante. Enquanto o imperador tinha a
esperança de que o concílio fosse unir a cristandade ocidental como forma de
fortalecer o poder imperial contra os turcos, o papa queria que o concílio
anatematizasse todas as formas de heresia protestante. No final o concílio
proveu o fundamento para uma revitalização do catolicismo e o eventual sucesso
da contra-reforma.
Em respeito à questão do pecado original, o
objetivo do concílio de Trento foi corrigir o ensinamento dos reformadores
protestantes sobre a radical corrupção da natureza humana pelo pecado de Adão. Os
decretos desse concílio representam a afirmação mais compreensível e definitiva
sobre o pecado original jamais afirmada pela igreja católica romana.
Se alguém não professa
que o primeiro homem Adão perdeu imediatamente a justiça e a santidade nas
quais foi constituído quando ele desobedeceu ao mandamento de Deus no paraíso;
e que, através da ofensa desse pecado, ele incorreu na ira e na indignação de
Deus, e consequentemente incorreu na morte com a qual Deus o havia ameaçado e,
junto com a morte, a escravidão ao poder que a partir daquele tempo tinha “o
poder da morte” (Hb 2:14), ou seja, do diabo; “e que é o Adão completo, tanto
corpo como alma, que foi transformado para o pior através da ofensa de seu
pecado”: que seja anátema.
Canon Dois
Se alguém afirmar que o
pecado de Adão foi prejudicial somente ao próprio Adão e não aos seus
descendentes, e que foi somente ele que perdeu a santidade e justiça que tinha
recebido de Deus, e não para nós também; ou que depois de sua contaminação pelo
pecado da desobediência, ele “transmitiu à humanidade não somente morte” e
punição “do corpo, mas não também o pecado, que é a morte da alma”: que seja
anátema. Pois ele contradiz as palavras do apóstolo: “através de um só homem
entrou o pecado no mundo, e através do pecado a morte, e a morte passou a todos
os homens por que todos pecaram” (Rom 5:12)
Canon Três
Se alguém afirmar que
esse pecado de Adão, que é um por origem, e que é comunidade para todos os
homens por propagação não por imitação (propagatione,
non imitatione transfusum), e que está em todos os homens sendo-lhes
peculiar, é retirado seja pelos poderes da natureza ou através de qualquer
remédio outro que não seja os méritos do único mediador, nosso Senhor Jesus
Cristo que nos reconciliou com Deus através de seu sangue, “o qual se tornou
justiça, santificação e redenção” (1 Cor 1:30); ou nega que, através do
sacramento do batismo corretamente conferido na forma da igreja, esse mérito de
Jesus cristo é aplicado tanto a adultos quanto à crianças: que seja anátema.
Pois “não há debaixo do sol nenhum outro nome pelo qual importa que sejamos
salvos” (Atos 4:12). Por isso aquele voz: “Eis o cordeiro de Deus que tira o
pecado do mundo” (João 1:29). E “todos que foram batizados em Cristo, de Cristo
se revestiram” (Gal 3:27).
Canon Quatro
“Se alguém nega que recém-nascidos devam ser
batizados,” mesmo que ele nasça de pais já batizados, “ou diz que eles são de
fato batizados para a remissão dos pecados, mas que eles não possuem nada do
pecado original de Adão que precise ser expiado pelo banho da regeneração” para obter a vida eterna; “e
consequentemente, que para eles a forma do batismo – ‘para a remissão dos
pecados’ – deva ser entendida, não em um sentido verdadeiro, mas falso: seja
anátema. Pois as palavras do apóstolo “através de um só homem entrou o pecado
no mundo, e através do pecado a morte, e a morte passou a todos os homens por
que todos pecaram” (Rom 5:12), não podem ser entendidas de outra forma do que a
forma como a igreja católica sempre as entendeu. Por causa dessa regra de fé”,
de uma tradição dos apóstolos “mesmo recém-nascidos que não foram sequer
capazes de cometer quaisquer pecados pessoais, são verdadeiramente batizados
para a remissão dos pecados, que neles nos quais ele foi contraído [contraxerunt] por geração deve ser
lavado através da regeneração” (DS, 223). “Quem não nascer da água e do
Espírito não pode entrar no reino de Deus.” João 3:5
Canon
Cinco
Se alguém nega que através da graça de Nosso Senhor
Jesus Cristo conferida no batismo a culpa do pecado original é cancelada, ou
mesmo afirma que tudo que tem a natureza verdadeira e própria do pecado não é
retirada, mas é apenas limpada superficialmente ou imputada: que seja anátema. Pois
Deus não odeia nada daqueles que foram regenerados por que “não há condenação
para aqueles que estão verdadeiramente sepultados com Cristo através do batismo
na morte” (Rom 6:4), que “não andam de acordo com a carne” (Rom 8:1), mas se
despindo do velho homem e se revestindo do novo homem “que foi criado segundo a
imagem a Deus” (Ef 4:22ss; Col 3:9ss), são feitos inocentes, sem mácula, puros,
não mais odiosos, mas amados filhos de Deus, “herdeiros de Deus e co-herdeiros
com Cristo” (Rom 8:17), de forma que absolutamente nada atrasa sua entrada no
céu. É a mentalidade desse concílio e ela professa que a concupiscência ou a
faísca do pecado permanece no batizado; mas desde que ele deixe de constituir
em uma prova, isso não tem mais poder de machucar aqueles eu não consentem e
que, pela graça de Jesus Cristo, resistem de forma madura. Além do mais,
aqueles que “lutam segundo as normas recebem a coroa” (2 Tim 2:5). Quanto a
essa concupiscência que às vezes o apóstolo chama de “pecado” (Rom 6:12ss),
esse santo concílio declara que a igreja católica jamais a entendeu como sendo
verdadeira e propriamente “pecado” naqueles que nasceram de novo, mas por que é
do pecado e inclina ao pecado. Se alguém pensa o contrário: que seja anátema.
O concílio de Trento ao invés de definir o que é o
pecado original descrê quais são os seus resultados – perda da justiça original
e santidade, morte, e escravidão ao poder do diabo (Canon um). O pecado de Adão
e seus resultados são transmitidos à sua descendência (Canon dois) através da
propagação não por imitação (Canon três). Dessa forma o pecado de Adão em
virtude da imputação desse único pecado original a todos os homens é inerente a
cada ser humano.
O pecado original é retirado através do batismo que
é a aplicação da morte de Cristo em favor de adultos e crianças (Canon três).
Assim, mesmo recém-nascidos que ainda não cometerem pecados pessoais precisam
ser batizados (Canon quatro) para que a culpa do pecado original seja cancelada
(Canon cinco).
O Canon cinco está particularmente apontado contra
o ensino dos reformadores, especialmente de Lutero que afirmava “que a
concupiscência, entendida como a inclinação culposa do homem em direção ao mal,
permanece no cristão e constitui pecado em um sentido verdadeiro e apropriado.”[48]
Dessa forma o cristão, de acordo com Lutero, pode ser descrito como simus Justus et peccator (ao mesmo tempo
justo e pecador): “justo, por que pela fé compartilha da redenção de Cristo e,
no poder dessa fé, luta contra o mal que está dentro dele; pecador, por que
precisamente esse mal, como “concupiscência invencível”, permanece dentro
dele.”[49]
Como Lutero, João Calvino (1509-64) cria que o
pecado original era uma depravação hereditária que produzia as obras da carne
no homem. Essa corrupção, Calvino ensinava, não é, como Agostinho pensava,
encontrada primariamente nos apetites sensuais, mas também nas faculdades mais
nobres do homem.[50]
Jacó
Armínio (1560-1609) foi um reformador holandês professor na universidade de
Leyden na Holanda que veio a questionar alguns dos ensinamentos do calvinismo. De
acordo com Armínio nós recebemos de Adão uma natureza corrupta, mas não a
culpa. Nós iniciamos nossa vida sem justiça original, incapazes de obedecer aos
mandamentos de Deus sem ajuda divina, e destinados à morte. Como uma questão de
justiça, porém, Deus garante a cada pessoa um dom especial do Espírito Santo
(graça preveniente) que neutraliza a corrupção recebida de Adão. Ela torna a
obediência possível, capacitando a vontade humana a cooperar, o que ainda tem o
poder de fazer.[51]
Más tendências, disse Armínio, podem ser chamadas
de pecado, mas elas não envolvem em si mesmas culpa ou punição, nem somos nós
responsabilizados ou culpados por causa do pecado de Adão. “Deus imputa para
cada homem suas inatas tendências ao mal somente quando ele conscientemente e
voluntariamente se apropria e ratifica essas tendências a despeito do poder em
contrário, que, em justiça ao homem, Deus lhe tem especialmente comunicado.”[52]
Sumário
Durante os primeiros 1600 anos da era cristã,
descobrimos que três visões dominaram a história da doutrina do pecado
original.
1. A visão Pelagiana: Nessa
visão Adão não transmitiu nem corrupção nem culpa aos seus descendentes. Seu
pecado é simplesmente um mau exemplo. Desde que o batismo não remove pecado ou
culpa nas crianças, coisas que elas não possuem. A morte física não é a
penalidade do pecado, mas uma lei original da natureza. Rom 5:12d “a morte
passou a todos os homens por que todos pecaram” significa: “todos incorreram em
morte eterna por pecarem pelo exemplo de Adão.” Os unitarianos defendem essa
visão hoje.[53]
2. A visão Agostiniana: Nessa
visão Adão transmitiu tanto corrupção quanto culpa aos seus descendentes. Ela
afirma que Deus imputa o pecado de Adão diretamente (imediatamente) a toda sua
posteridade, pois quando Adão pecou toda a humanidade estava seminalmente presente
nele como sua cabeça. Romanos 5:12d se refere à morte física, espiritual, e
morte eterna para todos os homens, pois todos pecaram em Adão (o cabeça natural
da humanidade).[54] Lutero
e Calvino sustentaram essa posição e a igreja luterana e a católica romana[55]
são as representantes modernas desse pensamento.
3. A visão arminiana: Nessa
visão Adão transmitiu corrupção, mas não culpa aos seus descendentes. O estado
de pecado no qual os homens nascem não envolve em si mesmo culpa ou punição. Somente
quando os homens pecam conscientemente e voluntariamente e dessa forma ratificam
sua natureza corrupta, então Deus imputa a cada homem sua tendências inatas
naturais ao mal. Romanos 5:12d é entendido como significando que a morte física
e espiritual é experimentada por todos os homens pois todos consentiram com sua
tendência pecaminosa inata por atos de transgressão. A igreja metodista é a
moderna representante dessa visão.[56]
A
era pós-reforma
Na era
pós-reforma três teorias (variações) adicionais a respeito da imputação do
pecado de Adão foram desenvolvidas.
1.
A teoria Federal:[57]
Essa teoria se originou com João
Cocceius (1603-69), um teólogo alemão que ensinou em Leyden na Holanda, e é
conhecida também como “a teoria das alianças.”
De acordo
com essa visão, Deus entrou em aliança com Adão como o cabeça federal da raça
humana, afirmando que se Adão obedecesse a Ele, e sua posteridade, eles
receberiam a vida eterna. Contudo, se Adão desobedece, a depravação e a morte
seriam o quinhão da humanidade.
Por Adão ter pecado, Deus reputa
todos os seus descendentes como pecadores, i.e., Deus imediatamente cria cada
alma da posteridade de Adão com uma natureza corrupta e depravada que sempre
conduz ao pecado e que é pecado em si mesma. Dessa forma, uma natureza corrupta
veio sobre a raça humana através da aliança de Deus e não através do pecado de
Adão.
Em contraste com Agostinho, que
acreditava que todos os homens pecaram em Adão, a teoria federal ensina que o
pecado de Adão é imputado para sua posteridade. Dessa forma Romanos 5:12d “a
morte passou a todos os homens, por que todos pecaram”, significa “a morte
física, espiritual, e eterna passou a todos os homens pois todos foram
reputados e tratados como pecadores.” A igreja reformada é uma representante
moderna dessa visão.
2.
Teoria da mediação imputada:[58]
Placens (1606-1655), professor da teologia em Saumur na França, ensinava que
todos os homens nascem fisicamente e moralmente depravados por causa do pecado
de Adão. Essa pecaminosidade inata descende das leis naturais da propagação
desde Adão à toda sua posteridade e que é a consequência, não a penalidade, a
transgressão de Adão como a fonte de todo pecado de fato, e é em si mesma
pecado. A alma é imediatamente (diretamente) criada por Deus, mas se torna
ativamente corrupta tão logo se une ao corpo.
Em certo sentido, portanto, o pecado
de Adão (culpa) é imputado aos seus descendentes, não imediatamente, como se
eles mesmos estivessem em Adão ou estavam representados nele, mas através da
mediação da natureza corrupta que é resultante do pecado de Adão. Em Romanos
5:12d, “a morte passou a todos os homens por que todos pecaram” significa “a
morte física, espiritual e eterna passou a todos os homens, pois todos pecaram
por possuírem uma natureza corrompida.”
3.
Teoria da Nova escola, ou New Haven:[59]
Essa teoria foi desenvolvida na universidade Yale (condado de New Haven) sob a
liderança de Timothy Dwight (1752-1817) e Natanael Taylor (1786-1858) e foi
direcionada particularmente contra a doutrina de Calvino sobre a predestinação.
A teologia da Nova Escola (Haven) ensinava
que um recém-nascido adentra a vida com predisposição ao pecado, mas essa
predisposição não era denominada pecaminosa uma vez que nada além de um ato
voluntário de transgressão pode, nessa visão, ser chamado de pecado. Consequentemente
crianças não necessitam de um Salvador. O pecado não é visto como um estado,
mas somente como um ato, uma vez que o homem não peca até atingir a idade da
consciência moral. A morte física é o resultado do pecado de Adão, mas a morte
espiritual é resultado do pecado próprio. Em Romanos 5:12d a expressão “a morte
passou a todos os homens por que todos pecaram”, significa: “a morte espiritual
passou a todos os homens, pois todos os homens de fato pecaram
individualmente”.
Para
resumir: As teorias federal e de Placens são próximas à teoria agostiniana,
a teoria da Nova escola (Haven) é similar à posição arminiana. Na tradição
agostiniana o homem nasce pecador e, portanto, peca; na tradição arminiana a
noção de pecado é confinado ao de um ato, dessa forma o homem é pecador por que
ele peca.
- A
doutrina do Pecado Original no adventismo[60]
As primeiras décadas
A incipiente Igreja Adventista do Sétimo Dia foi
edificada no contexto da Nova Inglaterra (EUA) e foi inicialmente influenciada
pela teologia da teoria da Nova escola (Haven).
George Storrs (1796-1867), um pastor metodista que
deixou sua igreja em 1840 por causa da questão da imortalidade natural, se
tornou a figura central no tratamento do pecado original no adventismo inicial.
Seu livro, Uma pergunta: São as almas dos ímpios imortais? Em seis sermões
(1842)[61]
teve ampla circulação entre os adventistas e foi adotado por muitos.[62]
A visão de Storrs pode ser resumida
em cinco pontos:
- O homem deve ser visto como uma unidade
holística. O que quer que afete qualquer aspecto do homem, afeta o homem
todo, i.e., o homem não tem uma alma ele é uma alma.
- Em sua criação original o homem foi feito
neutro, tanto em seu caráter com em sua natureza constitutiva essencial.
Ele não era nem santo, nem ímpio, mortal ou imortal. O caráter (bom ou
mal) é o resultado das escolhas em relação com a vontade de Deus. A
mortalidade é o resultado da desobediência de Adão. Dessa mesma forma a
imortalidade teria sido o resultado da obediência e do acesso à árvore da
vida no Éden.
- A natureza da penalidade pelo pecado original,
i.e., do pecado de Adão, deve ser vista como literal, física, temporal, e
factual, morte – o oposto da vida, i.e., a cessação de ser. Por nenhuma
manipulação dos fatos escriturísticos a morte pode ser espiritualizada no
conceito de depravação. Deus não puniu Adão tornando-o em um pecador. Essa
era a obra do próprio Adão. Todos morrem a primeira morte por causa do
pecado de Adão a despeito de seu caráter moral pessoal – incluindo-se as
crianças.
- O papel da expiação de Cristo é conceder uma
segunda provação às vítimas do pecado original. Consequentemente todos
podem demonstrar sua própria fidelidade através da obediência a Deus e o
destino eterno é determinado com base no pecado próprio, não no
pecado de Adão.
- Finalmente, a natureza “corrupta” que toda a
posteridade de Adão herdou dele não deve ser percebida como depravação,
mas como uma natureza mortal – “morrendo para morrer”, ou destinada a
morrer – mortalidade. O pecado original não significa morte espiritual
para o homem, antes ele significa a condição/estado mortal do homem.[63]
Adventistas primevos aceitaram a visão de Storrs a
respeito do pecado e a publicaram nas páginas da Review and Herald em 1854 e
1855 através de artigos escritos por J. M. Stephenson,[64]
D. P. Hall,[65] e
J. N. Loughborough.[66]
J. M Stepherson, cuja série de artigos foi posteriormente
publicada em forma de livro, cria que a posteridade de Adão estava envolvida em
seu pecado por representação, ou por seu representante, mas não de fato. Devido
à queda Adão se tornou mortal e transmitiu uma “natureza mortal, corrompida, e
morrendo” aos seus filhos. Mas por ter sido Adão que pecou pessoalmente, sua
posteridade não é responsabilizável apesar deles agora partilharem da mesma
condição. Responsabilização só vem com pecado pessoal.
Dessa forma, ninguém morre por causa de seus
pecados pessoais, exceto aqueles que estão perdidos, mas todos morrem a
primeira morte pequem eles pessoalmente ou não. Uma vez que crianças não têm
pecados pessoais elas são automaticamente cobertas pela expiação perfeita de
Cristo, ainda que elas morram por causa do pecado original.[67]
Ambos os
Testamentos representam o homem como estando exposto à morte por causa de
pecados pessoais. Mas, assim como todos morrem por causa do pecado original,
ninguém morre por causa de pecado pessoal, sem uma ressurreição para uma
segunda vida; Uma vez que a Bíblia ensina que haverá uma ressurreição dos
mortos, “tanto de justos como de injustos.” Ser precedido por uma segunda vida,
deve, pela natureza das coisas, existir uma segunda morte; Uma vez que a
penalidade pelo pecado é apenas uma morte, ainda em referência à sua relação
com a penalidade pelo pecado original, ela será a segunda morte.[68]
Como Storrs, Stepherson usava
“pecado original” como significando “pecado de Adão.” Ele via o resultado do
pecado de Adão apenas em termos de uma natureza física mortal, mas não como
morte espiritual ou natureza depravada. Ele entendeu a perdição espiritual do
homem somente como resultado de transgressão pessoal ao invés de como resultado
do pecado original.[69]
Tiago White (1821-1881) estava em
concordância básica com isso quando sugeriu que as crianças são inocentes e
nascidas num estado de graça. Apesar dele admitir que elas possuíam uma
natureza caída e corrupta, ele não cria que elas fossem culpadas por causa
disso. “Cristo cancelou a culpa da transgressão de Adão, e na ressurreição do
último dia, todos os efeitos da queda nos inocentes, ou justificados, serão
removidos, não antes.”[70]
Nas primeiras décadas Ellen White
(1827-1915) falou pouco sobre esse assunto, apesar dela discordar de seu marido
a respeito das criancinhas.
Crianças
são legítimas presas do inimigo, por que elas não são súditas da graça, não
experimentaram o poder expiatório do sangue de Cristo, e os anjos maus têm
acesso a essas crianças; e alguns pais são descuidados e permitem que seus
filhos cresçam com poucas restrições.[71]
O escritor adventista mais prolífico sobre o tema
do pecado de Adão durante as primeiras décadas foi Uriah Smith (1832-1903), por
longo tempo editor da Review. Como Storrs e Stepherson, Smith cria que Adão
tinha uma natureza média – criado sem moralidade – e que a penalidade do pecado
de Adão era a morte física, não a morte espiritual. Ele entendia a morte
espiritual como sendo a realidade da existência pecaminosa do homem, mas ele
via isso como um resultado do pecado de Adão, não como uma penalidade por causa
disso. Isso estava em contraste com a posição comumente defendida pelos
protestantes de que a punição era a morte – espiritual (estado de pecado),
temporal (separação da alma e do corpo), e eterna (miséria eterna).[72]
A definição de Smith de “depravação total”, i.e., “nossa inabilidade de render,
não acrescida por Cristo, obediência aceitável a Deus”,[73]
reflete as visões moderadas da teologia da Nova escola (Haven).[74]
O estado de pecado é realmente o pecado de fato da pessoal individual e somente
pecados pessoais, não sua natureza, decidem o destino eterno do homem.[75]
Assim que, para os primeiros adventistas o
resultado do pecado de Adão foi a mortalidade – uma natureza que está morrendo
– a morte física. Algumas vezes adventistas se referiam a isso como sendo a
natureza pecaminosa: “lembre-se que uma natureza mortal e uma natureza
pecaminosa são idênticas.”[76]
Por causa de sua aderência à imortalidade condicional, os adventistas
primeiramente estudaram o pecado original de uma perspectiva antropológica.
Uma
mudança no entendimento
A ênfase antropológica continuou até a década de
1880. Naquele tempo, particularmente depois de 1888 quando uma nova ênfase
sobre a justificação pela fé emergiu da assembleia da conferência geral em
Mineápolis, o foco dos estudos sobre pecado original mudou da antropologia para
a soteriologia. Já tão cedo quanto 1870 Ellen White tinha escrito:
O pecado
de Adão e Eva causou uma temerosa separação entre Deus e o homem. E aqui Cristo
se interpõe entre o homem caído e Deus, e diz ao homem, você ainda pode ir ao
Pai; há um plano divisado através do qual Deus pode ser reconciliado com o
homem, e o homem com Deus; e através de um mediador você pode se aproximar de
Deus.[77]
Esse tema da separação foi tomado em
1888 por L. A. Smith, editor assistente da Review, que argumentou sobre os
efeitos morais da separação de Deus. Ele acreditava que a queda de Adão afetou
as dimensões físicas, mentais e morais do homem. O homem peca por que ele é
moralmente degenerado; e todos os seres humanos são “herdeiros por natureza”
dessa natureza moral adoecida.[78]
Por volta da virada do século os adventistas do sétimo dia vieram a considerar
o pecado original em termos de separação de Deus.
A respeito da degeneração moral, os
primeiros adventistas criam que ela era adquirida mais por imitação do que por
herança física, pois não é pecado ou culpa que o cabeça da humanidade transmitiu
para seus filhos, mas simplesmente a morte, uma natureza mortal/morrendo.[79]
Ellen White, contudo, a partir da década de 1880 em diante passou a claramente
identificar isso com a natureza depravada herdada do coração humano.
A
degeneração moral, a que chamamos depravação,
encontra amplo espaço para atuar, e homens, mulheres e jovens que professam ser
cristãos exercem uma influência baixa, sensual, demoníaca.[80]
Hábitos
maus se formam mais facilmente do que bons hábitos, e os hábitos maus são
abandonados com mais dificuldade. A depravação natural do coração é responsável
por esse fato muito conhecido: que dá muito menos trabalho desmoralizar os jovens,
corromper suas ideias sobre moral e religião, do que incutir-lhes no caráter
esses duradouros, puros e incorruptos hábitos de justiça e verdade... Em nosso
presente estado decaído, tudo que é necessário é abandonar às suas tendências
naturais a mente e o caráter.[81]
Declarou-se-lhes
(Adão e Eva), porém, que sua natureza ficara depravada pelo pecado; haviam
diminuído sua força para resistir ao mal, e aberto o caminho para Satanás
ganhar mais fácil acesso a eles. Em sua inocência tinham cedido à tentação; e
agora, em estado de culpa consciente, teriam menos poder para manter sua
integridade.[82]
Por causa
do pecado sua (de Adão) posteridade nasceria com propensões inerentes para a
desobediência.[83]
Em seu
próprio âmago a natureza humana foi corrompida. E desde então o pecado tem
continuado sua obra odiosa, alcançando de mente em mente. Cada pecado jamais
cometido desperta os ecos do pecado original.[84]
Há em sua
natureza um pendor para o mal, uma força à qual, sem auxílio, não poderá ele
resistir.[85]
Há a questão se por acaso Ellen
White considerava/entendia a depravação como sendo pecado ou não, i.e., é o
homem culpado antes que ele cometa atos de pecado simplesmente por ele ser
depravado, ou não? E. Zackrison parece pensar que não,[86]
enquanto Roberto Olson acredita que nossa natureza pecaminosa (depravação)
também carece de perdão. Em apoio a essa posição ele cita Testemunhos para a
igreja, vol. 5, página 645, “Deus será glorificado se confessarmos a corrupção
inata, secreta do coração para Jesus somente do que se abrirmos seus recessos
ao homem finito, e falível.”[87]
Seguindo a direção de Ellen White,
um número de escritores adventistas durante a década de 1890 tomou um rumo
decidido em direção a uma expressão mais radical do pecado original do que nas
décadas prévias. E. R. Jones, um pastor de Healdsburg escreveu:
“Pela
desobediência de um só homem muitos se tornaram pecadores” (Rom 5:19). Ninguém
negará que isso se refere à depravação herdada, a natureza e tendência
pecaminosa na qual, através da desobediência, cada alma da raça de Adão é
nascida.[88]
F. J. Hutchins, evangelista pioneiro
e médico missionário na América Central descreveu o legado de Adão nos
seguintes termos:
Primeiro,
Adão perdeu sua inocência e nos deixou pecaminosos; segundo, ele perdeu seu
domínio, e nos deixou sem lar, sem uma herança; terceiro, ele perdeu sua vida,
e nos deixou morrendo, nossa vida perdida, e somente um processo de tempo requerido para demonstrar o fato pelo poder
da morte.[89]
Por volta de 1894, M. E. Kellogg
pôde escrever que foi o pecado de Adão que deixou o homem com “uma natureza
pecaminosa que o fazia sujeito à segunda morte – a morte eterna.”[90]
Essa visão claramente sugere que o legado de Adão não foi simplesmente a
mortalidade física que conduz à primeira morte, mas também a depravação
espiritual merecedora da segunda morte. Contudo, a velha visão tradicional de
Storrs persistiu em alguns círculos[91]
e Uriah Smith continuou até a sua morte em 1903 a reiterar e repetir a visão
que Storrs tinha introduzido sessenta anos antes.[92]
- Nossa posição no presente
Em 1988 a conferência ministerial da associação
geral publicou o livro “Nisto Cremos,” uma exposição bíblica de nossas vinte e
sete (na época) doutrinas fundamentais. No capítulo que trata da natureza do
homem é dito que o pecado inclui: “a transgressão da lei (1 Jo 3:4), uma falha
de alguém que “sabe o bem que deve fazer e não o faz” (Tg 4:14), ou tudo que
não provê da fé (Rom 14:23).”[93]
Na questão do pecado original ele diz:
Paulo observou
que “em Adão, todos morrem” (I Cor. 15:22). Em outro ponto ele mostra que
“Assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte,
assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram” (Rom.
5:12).
A corrupção do
coração humano afeta a pessoa em sua totalidade. É à luz desta realidade que Jó
exclama: “Quem da imundícia poderá tirar coisa pura? Ninguém!” (Jó 14:4). Davi
observou: “Eu nasci na iniquidade, em pecado me concebeu minha mãe” (Sal.
51:5). Paulo afirmou que “o pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não
está sujeito à lei de Deus, nem mesmo pode estar. Portanto, os que estão na
carne não podem agradar a Deus” (Rom. 8:7 e 8). Antes da conversão, fez notar o
apóstolo, os crentes eram “por natureza, filhos da ira” (Efésios 2:3), assim
como o restante da humanidade.
Embora, como
crianças, adquiramos comportamento pecaminoso através da imitação, os textos
anteriores afirmaram que já herdamos nossa pecaminosidade básica. A universal
pecaminosidade da raça humana constitui evidência de que por natureza tendemos
ao mal, e não ao bem.[94]
Assim é que o consenso dos eruditos adventistas, como expresso nesse
livro, define o pecado como um ato (1 Jo 3:4) bem como um estado (Salmo 51:4;
Efésios 2:3). Nós herdamos uma natureza pecaminosa (Pecado) que, a menos que
seja reprimida pelo Espírito Santo nos instiga a cometer atos individuais de
transgressão (Pecados).
A expressão mais clara da natureza hereditária de nossa pecaminosidade
inata é encontrada no Salmo 51:5 “Eu nasci na iniquidade, em pecado me concebeu
minha mãe.” O comentário bíblico adventista observa o seguinte a respeito desse
texto:
Davi reconhecia
que as crianças herdam naturezas propensas ao mal (ver Jó 14:4; Salmo 58:3;
Patriarcas e Profetas 61, 306; Ciência do Bom Viver 372, 373; O grande conflito
533). Ele não procurou desculpar o seu pecado, mas procurou enfatizar a ainda
maior necessidade da misericórdia de Deus por causa de suas tendências inatas
para o mal (ver Patriarcas e Profetas, 64).[95]
Pecado
como Separação de Deus
A causa fundamental de nosso estado pecaminoso (corrupção original) é
nossa separação de Deus. A primeira ação de nossos primeiros pais depois de seu
primeiro pecado foi a de se esconder (Gen 3:8). E a humanidade sempre seguiu
suas pegadas desde então. Através da queda a comunhão íntima que Adão e Eva
tinham desfrutado com seu Criador fora destruída. Ao pecar o homem quebrou seu
relacionamento com Deus.
A expulsão do homem do Jardim do Éden era um símbolo desse
relacionamento rompido. Dali em diante ele deveria existir longe de Deus. E
todo ser humano, exceto um, nasceu nesse estado de separação de Deus. Portanto,
Bebês morrem,
não por eles mesmos terem pecado de fato ou por estarem sendo punidos por Deus,
mas por que eles agora são parte dessa separação da fonte da vida. Todo homem
nasce centrado em si mesmo, não em Deus.[96]
A centralidade
em si mesmo (egoísmo) foi o motivo da queda de Satanás, “subirei acima das mais altas nuvens e serei semelhante ao Altíssimo” (Isaías
14:14). Esse também é o centro do problema do pecado original. Através da
queda, Ellen White diz, Satanás conformou com sua própria natureza o pai e a
mãe de nossa raça.[97] Existe alguma surpresa de
que nós nasçamos como rebeldes centrados em nós mesmos? Como quaisquer pais
sabem, as crianças são egoístas por natureza, tudo pertence a elas e orbita em
torno delas; as crianças precisam aprender a compartilhar, a serem altruístas
em suas atitudes. Como Heppenstall aponta:
O pecado original não é em si fazer coisas más, mas
ser mal. Então há uma conexão causal entre o primeiro pecado do primeiro homem
e o egoísmo de sua posteridade. A consequência do pecado de Adão foi total.
Consequentemente o pecado original é o estado do “eu” como um todo em relação a
Deus. Ele nunca é um problema unicamente psicológico ou biológico. Tentar
localizar o pecado ou a transmissão do pecado geneticamente simplesmente deixa
de lado o problema real. A questão é espiritual e não genética. O pecado não é
transmitido geneticamente dos pais aos filhos. O pecado não pode ser reduzido a
algo físico.[98]
A última parte
dessa citação contém um ponto importante. O PECADO é um problema espiritual,
não um defeito físico, apesar de que nossa degeneração física é certamente um
dos resultados do pecado de Adão. Mas “maus hábitos e práticas são
desenvolvidos, não vêm através dos genes.”[99] Quaisquer defeitos de
caráter herdados que tenhamos, como a morte eles são o resultado da queda – a
consequência de nossa separação de Deus. Nossa natureza pecaminosa está
localizada/manifesta em nossas mentes não em nossa corrente sanguínea. Por
causa disso Ellen White diz: “A fim de entender corretamente esta questão,
cumpre-nos lembrar que nosso coração é naturalmente depravado, e somos
incapazes, por nós mesmos, de seguir uma direção reta.”[100] Em outro lugar ela
escreve:
Pelo pecado, perturba-se todo o organismo humano, a
mente é pervertida, corrompida a imaginação. O pecado tem degradado as faculdades
da alma. As tentações exteriores encontram eco no coração, e os pés se volvem
imperceptivelmente para o mal.[101]
O efeito mais importante que o
pecado de Adão teve foi a separação entre o homem e Deus. Privado da arvora da
vida natureza física do homem começou a morrer. Privado da presença dos seres
santos a natureza espiritual (sua mente) se tornou degenerada. O homem se
tornou centrado em si mesmo e soberbo (a soberba da vida, 1 João 2:16). Seus
olhos, que tinham contemplado a glória de Deus na criação, agora lhe mostravam
o que ele desejava para si mesmo (a concupiscência dos olhos); E por causa da
íntima relação entre corpo e mente os instintos naturais como o sexo e o
apetite se tornaram nas perversões anti-naturais da carne (a concupiscência da
carne). Morte, doença, e uma natureza corrupta e depravada são todos resultados
da separação de Deus – a fonte de toda vida e de toda bondade.
Culpa
de Adão
A teoria
agostiniana do pecado original, que em grande medida se tornou a doutrina
católica romana, inclui a ideia de que a culpa de Adão é herdada por cada
recém-nascido. Bebês, portanto, precisam ser batizados para lavar sua culpa
herdada.
Os adventistas geralmente negam que
nós herdamos culpa de Adão. A Enciclopédia Adventista do Sétimo Dia
afirma: “Adventistas do sétimo dia creem que o homem herdou uma natureza
pecaminosa com propensão ao pecado, e seus escritos rejeitam ou não enfatizam a
ideia de que os homens herdam culpa pela transgressão de Adão.”[102]
Alguns
teólogos adventistas, contudo, incluem a culpa de Adão em sua definição de
pecado original. Robert Olson, por exemplo, diz: “nós herdamos culpa de Adão de
forma que mesmo um bebê que morre um dia depois de seu nascimento necessita de
um Salvador apesar de nunca ter cometido de si mesmo.”[103]
Ele baseia isso em afirmações de Ellen White como essas: “Relacionados ao
primeiro Adão, os homens nada receberam dele senão a culpa e a sentença de
morte.”[104]
“Adão pecou, e os filhos de Adão partilham de sua culpa e das consequências.”[105]
Contudo ela também diz: “É inevitável que os filhos sofram as consequências das
más ações dos pais, mas não são castigados pela culpa deles, a não ser que
participem de seus pecados.”[106]
Permanece a questão, portanto, se as
afirmações de Ellen White se referem a uma amputação de fato da culpa de Adão
aos seus descendentes ou se isso é apenas a consequência do pecado de Adão. Em
outras palavras, assim como morte veio a todos os homens por causa do pecado de
Adão, assim a culpa vem a todos por que todos nascem pecadores e cometem
pecados eles mesmos. A. L. Moore nega que Ellen White ensine a culpa herdada.
Ele diz:
A preocupação de Ellen White aparenta se relacionar
com as consequências da separação de Deus e ao processo de escravidão a Satanás
– que é herdada de Adão. Uma cadeia de causa e efeito é vista na qual o pecado
causa separação para com Deus e deixa a alma com culpa.[107]
Pode ser útil distinguir entre a
culpa de Adão e nossa culpa como uma consequência de nossa pecaminosidade
herdada. Nós não herdamos culpa, mas como uma consequência da queda de Adão nós
nascemos distantes de Deus, em um estado de pecado que é condenável, e,
portanto, nós somos culpados diante de Deus. Ellen White pode estar se
referindo à culpa desse ponto de vista.
- Implicações Cristológicas
Temos
visto que o pecado é mais do que um ato, ele é um estado que nós herdamos por
causa da separação entre Adão e Deus. M. J. Erickson disse corretamente:
O pecado não consiste meramente de atos e
pensamentos errados, mas também de pecaminosidade, uma disposição interior
inerente que nos inclina a atos e pensamentos errados. Dessa forma não é
simplesmente que somos pecadores por que pecamos; nós pecamos por que somos
pecadores.[108]
Agora, se
todo homem nasce um pecador, separado de Deus e necessitado de Salvação, então
como Cristo pôde ter nascido como homem e ainda assim ser sem pecado? Fontes do
início do adventismo mostram uma grande divergência sobre a questão da natureza
humana de Cristo. Em 1888 G. W. Morse responde à questão: “Se Cristo não
possuiu nossa natureza carnal, ou paixões malignas, como ele pôde ser tentado
em todas as coisas?” dizendo:
O único ponto de diferença entre a oportunidade
dele e a nossa, para resistir a tentações, é encontrado no fato de que ele não possuía nenhum traço, ou tendência,
para pecar, como nós temos. É preciso ter em mente o fato de que Cristo
veio ao mundo para começar do ponto onde Adão havia iniciado, e não do ponto
onde nós nos encontramos.[109]
Dois anos
mais tarde, em 1890, E. J. Waggoner, editor da revista Signs of the times, escreveu em seu livro Cristo e sua Justiça:
O fato de que Cristo tomou sobre si a carne, não de
um ser sem pecado, mas do homem pecaminoso, ou seja, aquela carne que ele assumiu tinha todas as fraquezas e tendências
pecaminosas às quais a natureza humana está sujeita, isso é demonstrado
pela afirmação de que “ele foi feito da semente de Davi segundo a carne.”[110]
Com justiça a Waggoner, devemos
lembrar que os adventistas do sétimo dia acreditavam naquela época que
propensões e inclinações a pecar não eram pecado no sentido estrito da palavra.
Por um lado, a resposta à pergunta
feita a Morse deve evitar fazer de Cristo um homem assim como nós. Pois a
solidariedade corporativa da raça humana com Adão tornou impossível que alguém
da raça humana vivesse acima do problema fundamental do pecado, i.e., da
separação de Deus. “Somente alguém de fora da raça humana poderia entrar nela
para promover uma mudança.”[111]
Por outro lado, ela evita fazer de Cristo tão diferente do homem de forma que
ele não posse ser identificado conosco. “Ele precisa ser um conosco em
natureza, mas não em pecado (pecado como separação de Deus, como natureza, ou
como atos).”[112]
Os dois lado do problema estão
presentes na miraculosa concepção de Cristo (Lucas 1:35), quando ele tomou
todas as limitações de nossa humanidade, exceto o pecado (ver o texto grego de
Hebreus 4:15).
Ele [Cristo] deixou de lado seu manto real por nós,
desceu do trono no céu, e condescendeu em revestir sua divindade com a
humanidade e se tornou como um de nós exceto no pecado.[113]
Jesus era
tanto semelhante quanto diferente de Adão em sua natureza humana.
“Não era a Humanidade adâmica em
virtude de possuir as inocentes fraquezas dos caídos. Não era a natureza caída
porque Ele jamais caiu em impureza moral. Sua natureza era, portanto, mais
apropriadamente a nossa humanidade, porém sem pecado”.[114]
A afirmação
em Romanos 8:3 de que Jesus veio “em semelhança de carne pecaminosa” não
significa que ele tinha carne pecaminosa, de outra forma a palavra
“semelhança” seria inapropriada. A palavra grega homoiomati se refere à semelhança não à “igualdade”.[115] Jesus não era pecador
nem por natureza nem por atitudes. Dessa forma é que Ele era um substituto
único – o cordeiro perfeito.
Sumário e Conclusões
Uma pesquisa
da história da doutrina do pecado original indica que particularmente esse
ensino bíblico foi entendido de formas bastante variadas. As mais influentes
foram as interpretações de Pelágio, Agostinho, e de Armínio.
Até o fim do
século 18 a teologia agostiniana dominou o entendimento do pecado original na
América (do Norte). Os teólogos da Nova Escola (New Haven) no século 19, em sua
oposição à posição calvinista de teologia federal, desenvolveram uma doutrina
do pecado original similar à posição arminiana.
O adventismo
do sétimo dia, nascido no ambiente da Nova Inglaterra, aderiu a uma
hamartologia (doutrina do pecado) semelhante à dos teólogos da Nova Escola (New
Haven) que viam a herança do homem nem como responsabilidade nem como
significando propriamente pecado. Existe uma conexão perceptível entre a
teologia da Nova Escola, o condicionalismo de George Storrs, e o entendimento
do pecado original no início do adventismo.
Os primeiros
adventistas ensinavam:
1) Adão em seu estado antes da queda
tinha uma natureza média – capaz de se tornar moralmente bom ou corrupto.
2) O pecado original era entendido como
se referindo apenas ao pecado de Adão.
3) A penalidade pelo pecado de Adão era
vista apenas em termos de uma natureza mortal – morte física. Essa natureza
mortal também era chamada de natureza pecaminosa.
4) A morte espiritual (depravação) era
vista como uma consequência não como uma penalidade do pecado original.
5) Pelo pecado ser definido em termos
de Transgressão da lei, a depravação não era considerada como sendo pecado, mas
como a tendência ou inclinação natural para pecar.
Os
escritos de Ellen White a partir de 1880 em diante vagarosamente mudaram a
visão da igreja em direção a um entendimento mais bíblico. Pelo final do século
foi reconhecido que o legado de Adão não foi simplesmente a mortalidade física
que conduz à primeira morte, mas também a depravação espiritual que merece a
segunda morte.
Os
adventistas do sétimo dia hoje, de forma geral, definem o pecado como falta de
conformidade com a vontade de Deus, seja por atos ou por condição (estado). Eles
creem que as crianças nascem com uma natureza pecaminosa e depravada como
consequência do pecado de Adão e como o resultado da separação de Deus. Esse
estado pecaminoso significa que se um bebê morre poucas horas depois de seu
nascimento ele/ela está sujeito(a) à segunda morte, mesmo que ele/ela não tenha
cometido nenhuma transgressão de nenhum mandamento.
Se assim não fosse, então os bebês que
morreram não precisaram de um Salvador. Cristo não permitiu tal exceção quando
disse: “Eu Sou o caminho, a verdade, e a vida, ninguém vai ao Pai senão por
mim” (João 14:6).[116]
Que cada
recém-nascido possua a culpa de Adão não é algo aceito comumente entre os
adventistas. Não obstante, o termo pecado original é usado por autores
adventistas – “não no sentido de culpa herdada, mas de uma inerente disposição
a pecar.”[117]
Para sermos claros e evitarmos confusão, eu sugeriria que usássemos a expressão
“pecado original” para designar o conceito agostiniano de culpa imputada e
depravação; e a expressão “corrupção original” para designar o estado de pecado
no qual cada membro da raça humana nasce.
Existe uma
tendência da parte de alguns adventistas em voltar ao entendimento de nossos
pioneiros com respeito ao pecado original, com objetivo de justificar sua
oposição ao nosso presente entendimento (que eles consideram como sendo
calvinista). Contudo, qualquer entendimento de verdades teológicas deve levar
em consideração todo o contexto escriturístico bem como os conselhos inspirados
de Ellen White.
Enquanto
alguns creem que o pecado é apenas uma violação consciente ou negligente da
vontade de Deus, nosso estudo da Escritura tem demonstrado que o pecado é
também um estado no qual nascemos (corrupção original). Esse estado pecaminoso
permanecerá conosco até o fim, mesmo que pela graça de Deus sejamos capazes de
vencer todas as tentações para pecar.
Um
entendimento correto da natureza do pecado é também algo vital para uma visão
equilibrada da natureza de Cristo. Conquanto ele tenha se tornado verdadeiro
homem, “semelhante aos irmãos” (Hebreus 2:17), ele não herdou a corrupção
original na qual nós nascemos (Hebreus 4:15).
O estudo do
pecado e corrupção original deveria nos conduzir a uma maior conscientização de
nossa parte sobre a necessidade de justiça/justificação. Que nós necessitamos
de um Salvador desde o dia em que nascemos, não apenas depois de transgredirmos
a lei de Deus, essa é a mensagem desse estudo. O Evangelho Eterno de Jesus
Cristo satisfaz nossa necessidade.
Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a
salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego; visto que
a justiça de Deus se revela no evangelho, de fé em fé, como está escrito: O justo
viverá por fé.
Romanos
1:16-17
[2] Para alguns dos
pensamentos e fontes desse artigo estou em débito para com Norman Gulley, “Preliminary Considerations of the Effects and
Implications of Adam’s Sin”, Adventist Perspectives, 2:2(1988), 28-44.
[6] Charles Ryder Smith, The Bible Doctrine of Sin and of
the Ways of God with Sinners (London: Epworth, 1953), p.20.
[9] R. C. Trench, Synonyms of the
New Testament (Grand Rapids: W. B. Eerdmans, 1948), p.239.
[16] J.
D. Douglas, ed., The New International Dictionary of the Christian Church
(Exeter: Paternoster Press, 1978), p.52.
[17] Todas as citações antigas nessa
seção foram tiradas de James H. Charlesworth, ed., The Old Testament
Pseudepigrapha 2 vols.(New York: Doubleday, 1983.
[19] Nathan Ausubel, The Book of
Jewish Knowledge (New York: Crown Publishers, 1964), p.506.
[21] Louis Berkhof, The
History of Christian Doctrines (Grand Rapids: Baker Book House, 1975), p.128.
[23] Julius Gross,
Entstehungsgeschichte des Erbsündendogmas, 2 vols. (München: E. Reinhardt
Verlag, 1960), 1:94.
[24] James Hastings, ed.
Encyclopedia of Religion and Ethics, 13 vols. (Edinburgh: T. and T. Clark,
1956), 9:560.
[39] Essa seção está baseada em Bengt
Hägglund, History of Theology (Saint Louis: Concordia Publishing House, 1968),
pp. 135-136, and Berkhof, pp.134-135.
[41]
Ibid., p.364. Nesse argumento Agostinho confiou na
tradução de Rom 5:12 da Vulgata que diz: “in quo omnes peccaverunt,”
i.e., “em quem todos pecaram.” Todas as traduções modernas reconhecem que a
expressão grega “eph ho” tem o sentido de “por que” ou “considerando que”
[42]
Isso é diferente dos reformadores que disseram que apenas a fé em cristo e Seus
méritos justificam o homem, as obras não entram aqui.
[55] Há uma
diferença entre o catolicismo e o luteranismo a respeito da questão se o
cristão permanece pecador após o batismo. Lutero
disse que ele permanece um pecador, o concílio de Trento no Canon cinco negou
isso.
[60] Essa seção é baseada em grande
medida em Edwin H. Zackrison, “Seventh-day Adventists and Original Sin”
(unpublished Ph.D. dissertation, Andrews University, 1984).
[61] L. E. Froom, The
Conditionalist Faith of Our Fathers, 2 vols. (Washington, D.C.: Review and
Herald, 1966), 2:307.
[65] D. P. Hall, “The
Mortality of Man,” RH 6, Aug.-Sept. 1854; “Man Not Immortal,” RH 6, Sept.-Dec.
1854.
[74] Zackrison, p.261. Cf. Quando ... eu digo que a humanidade é inteiramente
depravada por natureza, eu não quero dizer que sua natureza é em si mesma
pecado, nem que sua natureza é a causa física ou eficiente de seus pecados. Mas
eu quero dizer de que sua natureza é a ocasião, ou razão de seu pecado – que
tal é a sua natureza, que em todas as circunstâncias apropriadas de seu ser,
eles irão pecar e apenas pecar . . . Quando o apótolo afirma, que a humanidade
foi feita pecadora por natureza, ele quer dizer simplesmente que tal é a sua
natureza que uniformemente em todas as circunstâncias apropriadas de seu ser, ele
pecarão (Nathaniel Taylor, Concio ad Clerum 2 [Ahlstrom, Theology in America,
p. 224]), Zackrison, p.335.
[75] U. Smith, “What is the
Penalty of the Law?” RH 9:23 (April 9, 1857):181.
[80] Ellen G. White, Letter
26d, 1887, reprinted in In Heavenly Places, p. 196. (itálicos supridos).
[87] Robert W. Olson, “Outline
Studies on Christian Perfection and Original Sin”, Insert to Ministry, Oct.
1970, p.29.
[95] F. D. Nichol, ed.,
Seventh-day Adventist Bible Commentary 7 vols. (Washington, D.C.: Review and
Herald, 1954), 3:755.
[102] Don F. Neufeld, Ed.
Seventh-day Adventist Encyclopedia (Washington: Review and Herald, 1966),
p.748.
[104] White, Ellen G. Carta 68,
1899 (6 BC, 1074). O contexto imediato dessa citação é a educação das crianças:
“Os pais têm encargo mais sério do que imaginam. O pecado é a herança dos
filhos. O pecado os separou de Deus. Jesus deu Sua vida para poder unir com
Deus os elos partidos. Com relação ao primeiro Adão, os homens nada receberam
dele senão a culpa e a sentença de morte. Mas entra Cristo e passa pelo terreno
em que Adão caiu, suportando cada prova em favor do homem. Ele redime o
terrível fracasso de Adão por sair da prova incontaminado. Isso coloca o homem
em situação vantajosa diante de Deus. Coloca-o onde, através da aceitação de
Cristo como Salvador, ele se torna participante da natureza divina. Assim ele
se torna conectado com Deus e com Cristo.”
[105] Idem, Fé e Obras, p. 88.
Essa afirmação aparece em um artigo na Signs of the times, 19/05/1890 intitulado
“Obediência é santificação.” O parágrafo completo é o seguinte: “Temos motivo
para incessante gratidão a Deus porque Cristo, por Sua perfeita obediência,
reconquistou o paraíso que Adão perdeu pela desobediência. Adão pecou, e os
filhos de Adão partilham de sua culpa e suas consequências; mas Jesus assumiu a
culpa de Adão, e todos os filhos de Adão que correrem para Cristo, o segundo
Adão, podem livrar-se da penalidade da transgressão. Jesus recuperou o Céu para
o homem suportando a prova a que Adão deixou de resistir; pois Ele obedeceu
perfeitamente à lei, e todos os que têm correta compreensão do plano da
redenção verão que não podem estar salvos enquanto continuam na transgressão
dos santos preceitos de Deus.”
[106] Idem, Patriarcas e Profetas,
p. 306. Esse é um comentário de Ellen White sobre o segundo mandamento que diz:
“visitando a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira ou quarta geração
daqueles que me odeiam.”
[113] White, Youth’s Instructor, Oct.
20, 1886.
[115] W. F. Arndt and F. W. Gingrich, A Greek-English Lexicon of the NT 2nd
ed. (Chicago: University Press, 1979), p.567. s.v. “homoioma.” A respeito de
Romanos 8:3 os autores dizem que a palavra homoiomati
tra a ideia de que “nessa terra a carreira de Jesus era similar à carreira
do homem pecaminoso e ainda assim não absolutamente igual à sua carreira.
[116] Gulley, p.34. Não podemos
concordar com Erickson (p. 639) que crê
que não há condenação até que alguém chegue à idade da responsabilidade. Ele
diz, “Se uma criança morre antes de ser capaz de fazer decisões genuinamente
morais, só existe inocência, e a criança irá experimentar o mesmo tipo de
existência com o Senhor como irão aqueles que atingiram a idade da
responsabilidade moral e tiveram seus
pecados perdoados como resultado de terem aceitado o convite de Salvação
baseado na morte expiatória de Cristo.” Essa linha de raciocínio introduziria a
ideia de que algumas pessoas chegarão ao céu sem um Salvador e que é melhor que
as crianças morram, pois estarão salvas para a eternidade, do que crescerem e
terem a possibilidade de perder a eternidade através de escolhas erradas.
Um comentário:
Ezequiel, diante da mais recente visão adventista sobre corrupção original, como que fica a salvação dos natimortos e recém nascidos que morrem?
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