terça-feira, 20 de março de 2012

O conceito de "perfeição" nos escritos de Paulo

...advertindo a todo homem e ensinando... em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo homem perfeito em Cristo
Colossenses 1:28

O tema da perfeição cristã é maravilhoso, instigante, e reconhecidamente difícil. Existem muitas concepções filosóficas e teológicas em torno de sua definição e de qual seja sua manifestação na realidade da vida cristã, e para enriquecer  ainda mais esse debate trago aqui a tradução do verbete: "Perfeição/Maturidade" do  Dicionário de Paulo e suas cartas (Dictionary of Paul and His Letters, Gerald F. Hawthorne, Ralph P. Martin [editors]) na esperança de que ele auxilie a compreensão dos leitores de alguma forma!

Para acessar a tradução apenas clique no link "mais informações" logo abaixo e bom estudo!



Perfeito/Maduro
Nos escritos de Paulo a perfeição ou maturidade transmitem várias ideias relacionadas ao conceito de cumprimento, de se atingir um alvo ou conclusão. A palavra efetivado em português captura uma nuance importante no pensamento de Paulo sobre esse assunto: aquele que é perfeito ou maturo atingiu seu alvo pretendido. Paulo comumente utiliza o adjetivo grego teleios (“perfeito,” “completo,” “maduro”) para transmitir o conceito, apesar de várias palavras cognatas também contribuírem para formar o quadro como um todo: teleioō (“aperfeiçoar,” “completar,” “amadurecer”), teleō (“completar,” “finalizar”), telos (“fim,” “resultado,” “propósito,” “completamente”) e teleiontēs (“maturidade,” “perfeição”). O conceito paulino inclui quatro aspectos diferentes: (1) simples maturidade, ou o alcance de um alvo; (2) a perfeição espiritual como o status de todos os cristãos “em Cristo”; (3) uma posição de perfeição relativa atingida pelos cristãos nesta vida; e (4) o estado de perfeição última que os cristãos esperam experimentar na era porvir.
1. Maturidade, tendo alcançado o alvo.
2. Perfeição espiritual como existência “em Cristo”.
3. Perfeição relativa nesta vida.
4. Perfeição absoluta na era porvir.
1. Maturidade, tendo alcançado o alvo.
Em vários lugares Paulo fala de maturidade em um sentido não teológico. Ele encoraja os coríntios a pensar somo adultos – pessoas maduras – não como crianças (1 Cor 14:20). Ele insiste, possivelmente de forma irônica, que cristãos maduros exercem uma espécie de julgamento sóbrio (Fil 3:15). O poder de Cristo, ele argumenta, cumpria seu alvo intencionado ou estava verdadeiramente operante quando Paulo estava mais fraco (2 Cor 12:9 – ver Fraqueza). Ao ponto da morte Paulo pôde afirmar que ele cumpriu com sucesso sua atribuição como apóstolo cristão (2 Tim 4:7).
2. Perfeição espiritual como existência “em Cristo”.
Paralelo ao senso de atingir o alvo/objetivo, se tornar um cristão conduz o ser humano a se torna perfeito, ou completo. Assim é que Paulo alude aos coríntios como “perfeitos,” ou “maduros” (1 Cor 2:6) pois para eles o Espírito revelou sua sabedoria que “não é deste século” (2:6, 10). Os coríntios são colocados em contraste com aqueles que não têm o Espírito (2:12, 14), que não possuem nenhum discernimento espiritual. O alvo/objetivo de Deus para Seu povo é que eles fossem perfeitos, e atingir esse alvo energizava o ministério apostólico de Paulo. Convencido de que Deus quer que todos sejam salvos, Paulo não deseja nada menos do que apresentar “cada pessoa” perfeita em Cristo (Col 1:28). Seu ministério fosse de exortação, ensino ou de outros meios, servia a esse alvo intencional (ver Du Plessis, 198-99).
            Apesar de a salvação em si trazer um status de perfeição, a nova vida em Cristo precisa ser efetivada. Qual é o seu alvo/objetivo intencionado? Para Paulo o alvo é a perfeição, em um nível tanto pessoal quanto coletivo. E a perfeição tem dois estágios: uma espécie relativa de perfeição que os cristãos atingem nessa vida, e um estágio de perfeição final e absoluta realizada somente na vida porvir.
3. Perfeição relativa nesta vida.
Primeiro Paulo defende a perspectiva da perfeição para os crentes individuais. Paulo insta os cristãos que foram tão grandemente agraciados com a salvação de Deus a procurarem a perfeição (Rom 12:2). A vontade de Deus é “perfeita,” os crentes, pela transformação renovadora de suas mentes realizada pelo Espírito de Deus, podem conhecer a vontade de Deus. Os propósitos de Deus em nada diminuem o alvo de que Seu povo devesse cumprir perfeitamente sua vontade. Ao mesmo tempo Paulo insiste que a perfeição, ou a maturidade, é obtida apenas através de se viver de acordo com a vontade de Deus (Col 4:12). Esses são alvos presentes para os cristãos procurarem.
            Em segundo lugar, na questão coletiva, Paulo insta a igreja à perfeição – para que eles se tornem adultos plenamente amadurecidos em todos os seus caminhos. Em efésios 4:13 Paulo chama não os crentes individualmente, mas a igreja inteira, para o objetivo de Deus para sua existência: a plenitude de Cristo.
            A maturidade também transmite a expressão corporativa da igreja de uma unidade caracterizada pela fé e pelo amor. Apesar da igreja já existir “em Cristo” como uma nova pessoa madura (Efésios 2:13), ainda assim ela precisa buscar essas virtudes com a ajuda dos ministros que Cristo tem dado a ela (Efésio 4:16). Isso se encaixa na ênfase de Paulo no amor em Colossenses 3:14, onde o amor liga e une os dons e os esforços dos membros da igreja. Buscar o amor, Paulo diz, produz a perfeição. Dessa forma a igreja se torna o que Deus intencionou que ela fosse. Aqui o dito de Lietzmann é útil em explica Paulo: “se torne o que você é.” “trabalha eticamente tudo o que está envolvido ao estar em Cristo” (Flew, 59).
4. Perfeição absoluta na era porvir.
Apesar da perfeição permanecer o alvo para os cristãos nesta vida, e que uma perfeição relativa deva ser atingida, Paulo vislumbrava um eventual estado de inteira perfeição para aqueles que estão em Cristo. Isso consiste em sentido supremo “o fim” ou “o estado completo.” Nesta era, tão santos ou amorosos quanto qualquer individuo ou igreja possam se tornar, a perfeição absoluta permanece ilusória, pois ela pertence à era porvir. Tudo é “em parte” até que venha o que é perfeito (1 Cor 1310). Mesmo as melhores qualidades ou ações que os crentes possam exibir no presente – incluindo-se o exercício dos dons espirituais mais impressionantes – são menos do que o objetivo final de Deus para Seu povo. Mas no fim, quando Cristo retornar e a igreja atingir seu destino final, a perfeição reinará. Paulo vê aquele destino como um prêmio no fim da linha, e ele trabalha diligentemente para alcançar aquela perfeição (Filipenses 3:12-14). Ele reconhece que ele ainda não era perfeito, mas ainda assim o estado consumado inspirava sua vida presente. Quando a ressurreição vier, ele receberá o prêmio. Então os cristãos serão verdadeiramente aquilo que Deus designou que eles fossem – perfeitos.
            Acreditava Paulo que os cristãos poderiam se aproximar nessa vida da perfeição final de estar sem pecado? Apesar de não ser extensa, a evidência sugere que Paulo nunca vislumbrou que os cristãos pudessem atingir um estado de impecaminosidade nesta vida. Ele nunca faz essa afirmação sobre si mesmo, nem ele jamais toma algum cristão como modelo de impecaminosidade. Ao mesmo tempo Paulo claramente vê o pecado como um inimigo derrotado. Apesar do cristão nunca se tonar completamente impecável nessa vida, Deus tem o objetivo de que eles devam e consigam evitar de pecar. E Paulo também ensina que é impossível para os cristãos não pecarem. Em Gálatas 5:16-26 ele defende o poder do Espírito sobre a natureza pecaminosa, e em Romanos 6:2, 6, 11-14, 18, 22 ele claramente insiste que resistir ao pecado não só é possível, mas é a resposta requerida daqueles que Deus justificou. O ponto não é que os cristãos alcancem um estágio no qual eles não possam pecar, mas que Deus os capacitou para que eles não pequem.
Bibliografia
A. Deissler and F. Mussner, “Perfection,EBT 2.658–67;
G. Delling, “τέλος ktl” TDNT VII.49–87;
R. N. Flew, The Idea of Perfection in Christian Theology (London: Oxford University Press, 1934);
P. J. Du Plessis, Teleios: The Idea of Perfection in the New Testament (Kampen: Uitgave, 1959);
H. K. La Rondelle, Perfection and Perfectionism (Berrien Springs, MI: Andrews University, 1971);
R. Schippers, “τέλος,NIDNTT 2.59–66;
R. Schnackenburg, “Christian Adulthood according to the Apostle Paul,” CBQ 25 (1963) 254–370;
B. B. Warfield, Perfectionism, Vol. 1 (New York: Oxford University Press, 1931);
J. A. Ziesler, “Anthropology of Hope,ExcT 90 (1979) 104–9.

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